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quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Segmento de pessoas com deficiência tem potencial de consumo de R$ 1 bilhão

O turismo de pessoas com deficiência no Brasil está praticamente restrito àqueles que têm dinheiro para pagar hotéis caros. O país é carente de equipamentos acessíveis e de espaços inclusivos. Sobre o tema falam os consultores Andrea Schwarz e Jaques Haber

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que há 24,6 milhões de pessoas, ou 14,5% dos brasileiros, com pelo menos um tipo de deficiência. Essa parcela da população, levando em consideração que se relaciona, em média, com pelo menos outras duas pessoas (pai e mãe, marido ou mulher ou um filho, por exemplo), representa um público com potencial de consumo de 1 bilhão de reais ao ano. O dado foi apresentado pela fonoaudióloga Andrea Schwarz e seu marido, Jaques Haber durante o Workshop Tour 2007 – Rumos do Turismo no Brasil, realizado em São Paulo no último dia 8. O casal é sócio na consultoria I.social.

Embora a cifra impressione, esse ainda é um montante que segue adormecido nos bolsos de um público carente de poder viver de forma independente. "Hoje, no Brasil, para uma pessoa com deficiência viajar, ela precisa ter dinheiro; do contrário, não consegue hospedagem", afirma Andrea, que há dez anos passou a usar cadeira de rodas e desde então se especializou em questões relativas a acessibilidade e inclusão.

É grande a lista de experiências que a consultora e o marido já viveram por causa da falta de acessibilidade nos locais turísticos. As histórias vão desde uma ocorrida em pousada na Serra da Canastra, onde o batente da porta do quarto teve de ser aberto com uma marreta para que a cadeira de Andrea passasse, até as diversas tentativas de ir ao banheiro em diferentes estabelecimentos na cidade de Paris. “Os lugares eram tão apertados que a cadeira não chegava até o toalete”, relembra ela, com bom humor.

Essas são situações que indicam a hostilidade do meio em acolher as pessoas com deficiência e estão presentes no dia-a-dia de quem não enxerga, usa de auxílio técnico para se locomover, não ouve ou tem dificuldades de cognição, caso das pessoas com deficiência intelectual (nomenclatura mais recente para a deficiência mental). Aliás, quando se trata de terminologia, o segmento de pessoas com deficiência é nomeado de várias formas: pessoas com necessidades especiais, portadores de necessidades especiais, doentes, entre outros. “Não se trata de doença nem de ser especial”, explica Andréa. “Necessidades especiais abrangem um público mais amplo, como idosos e gestantes. O termo correto é pessoa com deficiência”, explica.

A questão da acessibilidade muda de acordo com o tipo de deficiência. “Cada uma tem suas necessidades específicas”, diz. No caso dos cegos e das pessoas com baixa visão, o que deve ser levado em consideração ao tornar um ambiente acessível é a necessidade de orientação, dada a partir de placas em braille e piso tátil, por exemplo. Quando se trata de pessoas com deficiência física, o principal desafio é a locomoção – assim, é preciso atentar para medidas que facilitem a circulação, como rampas, guias rebaixadas, portas mais largas para que passe uma cadeira de rodas, como alguns exemplos. É possível que seu navegador não suporte a exibição desta imagem.

Se o cliente de um empreendimento de turismo for uma pessoa com deficiência auditiva, Andrea dá uma dica simples: procure falar de frente para a pessoa para que ela possa fazer a leitura labial. “Não é necessário gritar”, recomenda a consultora, que aproveita para destacar que são poucas as pessoas falantes que dominam a Língua Brasileira dos Sinais (Libras). No caso das pessoas com deficiência intelectual, a dificuldade é de cognição. "Não é necessário tratá-las como crianças", reforça Andrea.

A carência de lugares acessíveis impede a livre circulação dessa parcela da população e daqueles que convivem diretamente com ela. Andrea e Jaques contam que gostam muito de viajar, mas que há dificuldade em freqüentar pousadas. O que acontece é que turismo acaba sendo uma atividade restrita às pessoas com deficiência que têm dinheiro e podem pagar caro por diárias em hotéis de padrão internacional, que seguem as normas de acessibilidade.

Um exemplo citado pela consultora é o do Litoral Norte de São Paulo. Segundo ela, a região é extremamente carente de pousadas adequadas para receber pessoas com deficiência. Além das alterações físicas necessárias e que seguem os padrões da ABNT (NBR 9050), baseados no conceito de desenho universal, ou seja, um lugar para todos, há a questão do atendimento. Esta, por sua vez, não se limita apenas ao litoral paulista. “O importante no atendimento é agir com naturalidade e bom senso”, ressalta Andrea.

Os funcionários devem estar qualificados para prestar ajuda, mas não é paternalismo. “Também não é necessário o serviço dos bombeiros”, brinca, ao contar que, ao chegar a um local para dar uma palestra, três bombeiros vieram “socorrê-la” na saída do carro. Eles haviam sido avisados de que uma pessoa com deficiência física estava chegando. Apesar da boa vontade, foram inábeis, já que ela e o marido estão acostumados a descer do carro, montar a cadeira e sair andando.

Situações como essa e a de perguntas inadequadas podem ser evitadas com qualificação profissional. “O treinamento também é muito importante porque, familiarizado com as questões relacionadas à deficiência, o funcionário pode dar boas dicas de lazer, sabe como e quando auxiliar”, explica a fonoaudióloga ao revelar que esse atendimento pode ser um diferencial do estabelecimento, permitindo a ampliação das oportunidades de negócios.

Seu sócio e marido, Jaques Haber, destaca ainda que os benefícios de um estabelecimento acessível vão além do diferencial e incluem o fortalecimento da imagem institucional, a boa impressão que causa a todos os clientes, o atendimento à legislação e a contribuição para a inclusão social. (INÊS FIGUEIRÓ)

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