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quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Brasil, terra do sexo fácil e barato. Até quando?


Ela não tem mais de 14 anos. Corpo bronzeado, roupas mínimas, olhar vazio. O homem que abaixa sua blusa e acaricia seu corpo já passou há muito dos 50. Seus gestos são grosseiros, e seu olhar é pura perversão. A cena acontece na praia, à vista de todos, explícita. Seria chocante, se não fosse tão comum: o Brasil é hoje um dos destinos preferidos por estrangeiros que viajam em busca de sexo. Esqueça a beleza das nossas praias, ou a riqueza de nossa cultura: 'Fui para o Brasil por uma única razão: transar', diz um alemão, encantado com as nossas 'belezas naturais'. Acabar com a exploração sexual de crianças e adolescentes foi promessa da primeira gestão do presidente Lula, reforçada no último Carnaval. Mas a verdade é que muito pouco foi feito. Se continuarmos assim, o Brasil poderá desbancar a Tailândia e se transformar no campeão mundial do turismo sexual. A reportagem de Marie Claire esteve em Fortaleza, um dos principais focos desse tipo de turismo, e revela como esse comércio abusivo acontece bem debaixo de nosso nariz.

No aeroporto
Três jovens aguardam a chegada de um grupo de holandeses na ala do desembarque internacional. Só Regiane** sabe quem eles são, mas mantém mistério com as amigas. No ano passado, ela manteve um 'romance' com um deles. 'Homem brasileiro? Deus me livre! Não é preconceito, mas eles pagam mal e exigem muito.' Cearense, 19 anos, mãe de dois filhos, Regiane é garota de programa. Faz parte de uma rede de prostituição comum no Brasil: a do turismo sexual. 'Eu tenho dois gringos no momento. Esse holandês e um alemão que tá voando por aí.'

Homens como os clientes de Regiane, que cruzam o Atlântico atrás de sexo, atravessam sem dificuldade as portas de entrada para passar dias de rei por aqui. Como a prostituição no país não é crime, os estrangeiros se sentem à vontade para transar com brasileiras. O problema é que, no rastro do sexo pago, forma-se um esquema que movimenta o tráfico de drogas, o tráfico de mulheres, a falsificação de documentos e, pior, a exploração sexual de crianças e adolescentes.

A entrada de estrangeiros no Brasil cresceu. Em 2004, foram mais de 4,7 mi-lhões. No ano seguinte, saltou para 5,3 milhões, segundo dados da Embratur. Só em janeiro de 2006, 61 mil passageiros, vindos especialmente da Europa, ater- rissaram no Brasil. Em janeiro passado, foram qua-se 65 mil. Como não existem estatísticas sobre turistas sexuais no país, é impossível afirmar quem é quem nesses vôos.

Os holandeses que estão chegando serão recepcionados por Regiane e suas amigas, Sandra e Taís, ambas de 18 anos e também garotas de programa. 'Eles gostam de moreninhas de canela fina, como eu', diz Sandra. Quando podem, elas também escolhem o cliente. Preferem carecas sarados e tatuados, um tipo comum entre os italianos -junto com alemães, holandeses e portugueses, o grupo mais manjado de turistas sexuais. Muitas sonham em casar e cair fora. 'Não tenho medo de ir embora com alguém que mal conheço. Tenho medo é de passar fome no Brasil', diz Regiane.

Na agência
A Alemanha é só um entre muitos pontos de partida de turistas que visitam o Nordeste. Itália, Holanda, Áustria e Portugal são outros. 'Drogas e mulheres têm na Europa, mas aqui o sexo é mais barato e fácil', diz Francesco, um italiano que já esteve 'inúmeras' vezes no Brasil.

As agências que combinam viagens e mulheres operam principalmente pela internet. Em contato telefônico com a Brasil-Club, com sede na cidade alemã de Dortmund, a reportagem foi orientada a consultar o portal da empresa. O site traz fotos de mulheres seminuas em poses eróticas, preços de possíveis diversões sexuais e um catálogo de garotas disponíveis para a temporada -o cliente pode fazer a escolha antes da partida. Oferece pacotes 'no Brasil com garotas e sexo a partir de 2.300 euros'. Só não diz onde fica o hotel.
Em novo contato por telefone, a reportagem foi atendida por Albert. Queríamos saber se era mesmo possível chegar ao Brasil e já encontrar uma mulher à disposição. 'Claro que é', resposta imediata. 'Basta preencher o formulário de inscrição on- line, indicando seu tipo de mulher: magra, normal, meio forte. Diga também a faixa etária que deseja e a cor de pele. Somos procurados devido a nossas latinas e afros.' Ele continua: 'As afros são negras, bem escuras. As latinas têm traços mais misturados, são da cor marrom.'

A única restrição é para quem procura garotas menores de idade. 'Não trabalhamos com menores porque isso no Brasil dá cadeia. Mas moças jovens tudo bem.' Albert diz que o endereço da hospedagem só é fornecido diante preenchimento de cadastro e pagamento de sinal de mil euros. A Brasil-Club trabalha no Rio de Janeiro e em cidades do Nordeste.

Além do Rio, Fortaleza, Natal e Recife entraram para a rota do turismo sexual, em boa parte, em decorrência da propaganda oficial do governo, que durante décadas associou a imagem do Brasil a mulheres seminuas, receptivas e sensuais. A partir de 2000, essa estratégia foi abandonada, mas o estrago já foi feito. 'Em bom alemão, fui ao Brasil por uma única razão: transar', diz Oldmen, no site da Brasil-Club.

Na periferia
A casa de Regiane e Sandra, as garotas que dias atrás esperavam holandeses no aeroporto, fica em Pajuçara, um município miserável a 40 quilômetros de Fortaleza. Elas dividem, além das calçadas, a moradia de apenas três cômodos, que ainda abriga os filhos de Regiane, de 5 e 3 anos -eles ficam sob os cuidados uma senhora, que recebe R$ 200 mensais. Bichos de pelúcia e bonecas estão cuidadosamente ar-rumados no móvel da TV.

Sandra chegou com a luz do dia, dormiu algumas horas na cama de casal, que também divide com Regiane. Acordou há pouco e está irritada com o cabelo, todo rebelde. Como não tem tempo de fazer uma escova, tenta domar os fios com muito creme.

Disputando espaço no único espelho da casa, Regiane faz um caprichado rabo-de-cavalo. Depois, borrifa um perfume, de fragrância enjoativa, pelo corpo. 'Veio de Amsterdã.' Regiane conheceu Peter, o holandês, na orla da cidade, no ano passado. O combinado entre eles era um programa de uma noite, mas se estendeu durante a temporada dele. Esse tipo de arranjo é comum entre turistas e garotas. Um homem só, algum dinheiro e muitos presentes. No caso de Regiane, incluiu também uma viagem para Amsterdã.

Na mala que levou quase vazia, ela trouxe um casaco de neve, hoje encostado no fundo do armário, um aparelho de MP3, que é a alegria da casa, e meia dúzia de calças jeans bem justas que, mal aterrissaram, foram reformadas para marcar suas formas generosas. 'Ganhei de presente dele.'

Sandra está pronta, cabelo domado, rosto maquiado, blusinha e salto al-to 'sempre'. Regiane usa jeans e uma camiseta bem decotada e curta. As duas colocam nos bolsos a carteira de identidade, o batom e só. Vão à luta sem dinheiro nenhum, com a esperança de pendurar a corrida com um taxista conhecido -um elo forte nessa corrente difícil de romper do turismo sexual.

Leia Mais http://revistamarieclaire.globo.com/Marieclaire/0,6993,EML1503174-1740-2,00.html

Um comentário:

Alexander Zimmer disse...

Pois é, triste isso! Enfim...